sábado, 8 de setembro de 2012

Ex-Fla recebe cidadania australiana e sonha jogar a Copa no Brasil


No aniversário da independência do país natal, lateral Cássio ganha dupla nacionalidade e vê novo caminho para a carreira: a seleção da Austrália


australiano Cássio (Foto: Divulgação / Adelaide United)Cássio posa com a família ao lado da bandeira da
Austrália (Foto: Divulgação / Adelaide United)
Há 190 anos, no dia 7 de setembro, D. Pedro I declarava a independência brasileira e fazia seus súditos sonharem com um caminho diferente e dias melhores, longe do domínio português. Na mesma data, em 2012, um brasileiro a mais de 13 mil quilômetros do país também se tornou livre para sonhar. O lateral-esquerdo Cássio, ex-Flamengo, conquistou a cidadania australiana por defender há cinco anos e meio o Adelaide United e viu brotar um desejo adormecido: a chance de jogar uma Copa do Mundo, através de outra estrada.
Quando criança, Cássio pensava no dia que defenderia a amarelinha da seleção brasileira. Os planos mudaram um pouco, embora a combinação de cores da camisa continue igual. Agora, o lateral já consegue se enxergar vestindo o uniforme verde-e-amarelo australiano, em palcos brasileiros, em 2014. Um projeto que começa a evoluir a partir deste 7 de setembro.
Aos 32 anos, o brasileiro reconhece que a sua idade pode ser o grande empecilho para concretizar suas aspirações, mas vê a possível chance na seleção como grande combustível para sua carreira no momento. Apesar de reservar o desejo de jogar no Brasil – onde já atuou por Flamengo, Internacional, Santa Cruz e Marília – mais uma vez antes de encerrar a carreira, Cássio pretende ficar no Adelaide até 2014, para ficar mais perto do olhar do técnico Holger Osieck e do carinho dos torcedores, que já são seu grande trunfo na campanha para chegar até o time nacional.
australiano Cássio (Foto: Divulgação / Adelaide United)Cerimônia foi realizada no campo do Adelaide (Foto: Divulgação / Adelaide United)









Com a esposa, Juliana, e os dois filhos, Bernardo e Henrique, – um deles nascido no país – adaptados à Austrália, o carioca do bairro de Marechal Hermes apenas titubeia em uma pergunta: qual lugar escolherá para viver após a aposentadoria. Com sua independência declarada em duas línguas, Cássio ainda não sabe onde fincará sua bandeira para o resto da vida.
Confira a entrevista completa:
GLOBOESPORTE.COM - Como se sabe, no dia 7 de setembro é comemorado o aniversário da independência do Brasil. No mesmo dia, você conseguiu a cidadania australiana e acabou dando seu “grito de liberdade”, já que ganhou a chance concreta de vestir a camisa de uma seleção, o que dificilmente aconteceria no Brasil. Qual é o sentimento?
Cássio - Foi muito legal, um dia muito emocionante para mim e a minha família. A gente foi comemorar, porque foi um dia super importante. E, coincidentemente, é o dia 7. O dia foi muito bonito, a cerimônia também. Fiquei muito contente e emocionado com essa homenagem. E a partir de agora sou um cidadão australiano.
australiano Cássio (Foto: Divulgação / Adelaide United)Cássio, a esposa e os dois filhos recebem o certificado de cidadania(Foto: Divulgação / Adelaide United)
E a chance de jogar na seleção é realmente concreta?
Antes eu sonhava um sonho distante, mas hoje o sonho já é mais próximo da realidade. Tenho mais chances. Como aqui na Austrália há um pouco de carência de laterais, e eu faço um trabalho que é considerado bom, acho que as chances são boas. O técnico está ciente do meu trabalho. Eu respeito muito os jogadores que estão lá jogando, mas sou australiano agora e estou disponível como qualquer outro.
Qual o perfil da seleção australiana? São muitos jogadores do futebol local?
A base é uns 98% de jogadores que jogam lá fora, no Japão, Escócia, Inglaterra, Itália. Mas tem também uns dois ou três que jogam aqui. Mesmo assim, eu considero a possibilidade boa, já que o torcedor mesmo se empolgou muito com a situação. Eles me veem aqui já faz tempo e estão animados. Eles veem um brasileiro podendo jogar na Austrália e ficam um pouco comovidos por isso.
cassio adelaide (Foto: Divulgação/Site Oficial)Lateral atua pelo Adelaide desde 2007
(Foto: Divulgação/Site Oficial do Adelaide)
Coincidentemente, a camisa da seleção australiana também é amarela. Aumenta a identificação, não é?
Já até brincaram comigo, que eu vou vestir a canarinho do outro lado do mundo. Eu acho que terei emoção igual, como se eu estivesse vestindo a da seleção brasileira. Apesar de eu não estar aqui há tanto tempo assim, são cinco anos e meio, parece que tenho uns 15 anos na Austrália. Meu filho nasceu aqui, então eu teria o mesmo prazer de jogar pela seleção australiana. Se eu fosse jogar um dia contra o Brasil, eu iria encarar com naturalidade e fazer o máximo para ganhar. É uma possibilidade, mas estou pronto e disponível.
E pode realizar o sonho de todo jogador, que é participar de uma Copa do Mundo...
Na verdade, é um sonho mesmo. Eu sonho desde que era criança jogar uma Copa do Mundo, mas claro que pela seleção brasileira. Passaram-se anos e, depois dos 30, eu tenho uma possibilidade de jogar, mas pela Austrália. A chance é boa, é grande, tenho que continuar jogando bem. É um sonho que sempre tive e quem sabe pode se concretizar.
Por que acha que os torcedores estão apoiando a causa, querendo te ver na seleção?
Eu acho que um pouco dos dois. Pelo fato de eu ser brasileiro, de eu estar no mesmo clube desde que cheguei aqui. Sempre procurei ser leal ao meu clube. No Brasil, eu mudei de clubes devido a circunstâncias do futebol brasileiro, não recebia salário em alguns casos. Queria ter alcançado um longo tempo em algum time do Brasil, mas essa identificação veio aqui no Adelaide. Outros clubes vêm aqui, mas eu continuo fiel ao meu clube. Já fui duas vezes para a seleção do campeonato, já fui duas vezes o melhor jogador do meu clube no ano. Já ganhei muitos prêmios individuais. Acho que já fiz por merecer. Claro que não é muito cedo, mas meu corpo ainda está bem. É como se tivesse 23 anos.
australiano Cássio (Foto: Divulgação / Adelaide United)Cássio posa ao lado dos companheiros de time (Foto: Divulgação / Adelaide United)









Justamente, você já tem 32 anos. Não acha que a idade pode te atrapalhar para chegar à seleção?
Talvez esse seja o fator que a maioria das pessoas colocam como empecilho, mas eu não vejo assim. Jogo normalmente e treino todo dia. Estou me sentindo bem. O Adelaide está me dando essa chance de jogar, então não tenho porque pensar em parar. Tem jogadores como Juninho, Felipe, Seedorf... mais velhos e jogando em alto nível no Brasil. Agora o Del Piero veio aqui para o Sidney, com 38 anos. Eu acho que ainda tenho muito tempo pra jogar e nem penso em parar. Então esse sonho para mim é bem real.
Sobre sua carreira no Brasil, certamente o clube onde você ficou mais marcado foi o Flamengo. Guarda boas lembranças ou mais mágoas do clube?
Só guardo boas lembranças. Lá eu passei momentos maravilhosos. Os maiores títulos da minha carreira são pelo Flamengo. Tudo na vida é aprendizado. Eu creio que minha passagem por lá foi muito proveitosa, foi muito boa. Poderia ter ficado mais tempo, mas eu era muito jovem, queria jogar de titular, ganhar dinheiro, essas coisas. Quando se é jovem, não se segura um pouco o ímpeto. Mas é aquilo, talvez não estivesse aqui hoje se não tivesse saído do Flamengo.
Cassio no treino do Flamengo (Foto: Arquivo / Extra)Jogador foi revelado pelo Flamengo, onde atuou no
começo da década passada (Foto: Arquivo / Extra)
Mas você teve uma saída um pouco conturbada, acabou deixando o clube depois de virar reserva do Athirson, quando ele voltou do Juventus...
O Flamengo é um clube especial na minha carreira, e tenho muito carinho, assim como o Adelaide. Na época, eu queria jogar. Eu já tinha jogado muitas vezes pelo Flamengo e do nada eu fui para o banco. Na época, o Athirson era jogador de seleção brasileira, então nem tinha como reclamar de ficar no banco. Mas, como sempre fui jogador titular, desde a base, queria jogar. Quando passei por uma lesão no joelho e voltei, comecei a pensar em sair. Hoje eu vejo que a melhor coisa que eu fiz foi sair, pois estou aqui. Se eu tivesse ficado, minha carreira teria outro rumo.
Então, zero mágoa do clube ou de qualquer jogador?
Longe disso. Tenho ótimas lembranças daquele grupo, dele, do Leandro Ávila, do Reinaldo, do Roma... São muitos jogadores que tenho muito carinho e contato até hoje.
Aquela geração viveu momentos que são lembrados pela torcida até hoje. Você estava presente em dois deles, como o gol histórico do Pet de falta, contra o Vasco, em 2001, e o seu pênalti que as pessoas chamam de “espírita”, na final da Taça Guanabara contra o Fluminense, em 2001. Qual foi mais emocionante para você?
O gol de pênalti foi muito especial para mim, já que ficou marcado para o Flamengo e na minha carreira. Estou aqui na Austrália hoje e as pessoas ainda brincam comigo, que viram o pênalti de dez anos atrás. É bem gratificante. Mas vou ser sincero que o mais emocionante foi o gol de Pet, até porque estava do lado dele na hora do gol. Foi um título para o clube pelo qual eu até hoje torço.
australiano Cássio (Foto: Divulgação / Adelaide United)Cássio se emociona junto a esposa, após homenagem (Foto: Divulgação / Adelaide United)









Você já relatou que acompanha o futebol brasileiro. Como analisa as dificuldades do Flamengo com a lateral esquerda nos últimos anos, desde que o Juan deixou o clube?
Eu conheço o Juan e acho que a saída dele não foi nada legal. Desde que ele saiu, o Flamengo não conseguiu encontrar lateral igual a ele. Ele foi duas ou três vezes o melhor lateral do Brasil, já fez gol do título para o Flamengo (Copa do Brasil de 2006). E um cara desse do nada ser dispensado, ainda novo, ainda rendendo, não acho normal. Tinha que ser mais respeitado. Para mim, era para ele estar lá. Mas a gente não sabe o que acontece.
E você poderia ser uma opção?
Com relação a mim, eu ainda tenho a vontade de jogar no Brasil. Não agora, porque estou bem engajado com essa situação da seleção australiana. Agora que eu cheguei perto, quero persistir. Mas como ainda tenho alguns anos de carreira, tenho essa vontade de voltar a jogar no Brasil. E, claro, acho que não tem lugar melhor para voltar a jogar do que o Flamengo. Sei que não é fácil. Estou falando o que passa pelo meu coração. Se eu pudesse escolher, claro que eu jogaria lá. Uma volta para o Brasil daqui a uns dois anos não é algo que eu descarto.
Agora cidadão australiano, você já escolheu se vai continuar por aí depois da aposentadoria?
Essa é uma pergunta muito difícil. Hoje eu tenho dúvidas sobre isso. Vamos deixar acontecer, deixar na mão de Deus. Principalmente pelos meus filhos, já que os amigos deles, a vida deles está aqui. O mais novo nasceu aqui e o mais velho veio para cá com três anos de idade. A gente sempre os coloca em contato com meus pais, com os tios e os padrinhos, para não perder a ligação com o Brasil. Mas a vida aqui é muito boa. Claro que a qualidade de vida do Rio de Janeiro, cidade que eu amo muito, é ótima também, mas a vida aqui é fantástica. É uma dúvida constante que a gente carrega, mas acho que isso é bom para a vida. Graças a Deus, hoje eu tenho essa escolha, e por isso me considero um cara privilegiado.
*Jorge Natan, estagiário sob a supervisão de Marcos Felipe
australiano Cássio (Foto: Divulgação / Adelaide United)Cássio ainda não sabe onde vai morar ao fim da carreira (Foto: Divulgação / Adelaide United
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